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Cuidando ando

Foto do escritor: Mariana NassifMariana Nassif

Atualizado: 26 de jun. de 2023

O corpo fala. Quando a gente não escuta ele grita. O meu, por canais diversos, como Exú, a cabocla e as pombogiras.


Ansiedade, fadiga, dor nas juntas, insônia, névoa do cérebro, dificuldade em concentrar-se, perda de memória, dificuldade em engolir, constante perda de cabelo, sensação de sufocamento, zumbido no ouvido, depressão, alterações de humor, intestino irritável, falta de ar e problema nas glândulas, tireóide e paratireóide. Dentre mais outros tantos sintomas presentes numa lista enorme (que está na imagem neste post, logo ali embaixo), estes foram os que me acometeram - além das poeiras de pedras nos rins, expelidas no acostamento da serra, num parto amorosamente acolhido pelo Diego, que esteve meu companheiro durante toda essa viagem.


Durante as ultrassonografias solicitadas pelo gineco, a assistente anuncia: uma das suas próteses está rompida, procure seu médico. Procurei - a médica. Pedi uma indicação de cirurgiã do plano, ela disse que fosse até lá pra conversar e ver do que se tratava. “Algo muito comum, não se desespere”. Claro que, ao longo dessa história, diversas vezes me desesperei. Sugeriu a troca das próteses, rejeitei, contando mais sobre meu estilo de vida do que falando sobre saúde. Pesquisei, li depoimentos de diversas outras pessoas com o mesmo problema que eu com as próteses e, enfim, sabia que se entrasse no diálogo clínico seria longo o embate. Não quero, te agradeço muito a oferta mas não combina mais comigo. Ela aceitou, pediu mais exames e entramos com os burocráticos pedidos: aprovações, agenda de hospital, vacina de Covid. Era julho de 2021, estava na fila pelas minhas doses.


A violência mais esquisita que senti teve a ver com a tal da liberação via convênio. Na primeira vez, o retorno cobria a retirada e reposição da prótese rota, DE UM LADO SÓ, ignorando conclusivamente meu pedido de retirada bilateral em monobloco. Pelo que entendi, devido ao vazamento de material, a mastopexia - que é a reconstrução dos seios - era implícita, recomendada. Foi um choque de desrespeito receber este documento. Separaram meu par de seios, interpretei como “espere dar problemas do outro lado”. Deste ponto até a cirurgia, se passaram quase três meses.


Depois de abrir uma queixa formal, o plano cirúrgico foi aceito. Data marcada, fico sabendo que não é o ideal fazer uso recreativo de substâncias naturais. Afetam a quantidade de anestesia injetada. Reagendemos. A espera me incomoda, e de fato desenvolvi certa intolerância a quem tratava quase que somente da questão estética do assunto. “Vai ganhar uma repaginada, hein, do que você está reclamando?”. Afe. Me excedi, fiquei bastante sensível e percebi que minha peneira de autocuidado estava furada. Naquele período, diversas situações chegaram em um ponto tão extremo que seria impossível não repensar sobre. A principal delas, sem dúvida, tinha - e continua/tem - relação com: eu, uma mulher possivel.


Rompimentos, solidões. Boa companhia. Durante os quase cinco meses de recuperação, dos quais o primeiro totalmente limitada com os braços, fui bem acarinhada. Refazia os curativos diariamente na clínica, onde uma senhora totalmente afetiva me ajudava - no banho, com os cabelos, a fechar um botão, um zíper. Conversas boas, me sentindo uma delícia como amiga, como namorada - as trocas e crescimento edificados durante este período me são demais preciosas. Escrevo isso e recordo que, ao mesmo tempo, fiz a mudança de apartamento da minha mãe uma semana após a cirurgia, não podendo mexer os braços e carregando carrinho, os pontos com menos de dez dias. A peneira, os remendos. Percebe?

Com minha sobrinha Catarina num ovo no Tamar: topzinho e a liberdade de ter diversas formas


Aos poucos fui encontrando propostas e percursos que estavam mais ligados ao meu próprio gosto. Aprendi na prática que algumas compulsões a gente só encerra quando encara e assume a si mesma, sem a necessidade de preencher buracos de afeto com coisas. A conexão com o invisível é bastante presente na minha história toda, então afirmo que fui marcada pelas pombogiras que me acompanham: duas encruzilhadas em T invertido na caixa torácica não pode ser coincidência pouca, abençoadas por Seu Exú do Lodo - mofei, embolorei, limpei e nasci de novo.


Percebo as fundamentais transformações que venho realizando desde que, de peito aberto, me dispus a incorporar algo novo: na minha opinião, precisamos estudar para aprender direitos, varrer camadas e camadas de ódio à mulher que se transforma em mais um corpo. Vem sendo minha forma de, além de me cuidar e me posicionar com mais eficácia, politizar o assunto. Não sou só eu. Somos muitas. Da minha responsabilidade individual, tenho me sentido péssima em atrasar textos, como este, por exemplo. Foi preciso, pra dar conta de mais um sintoma que apitou há pouco e acabo de começar a olhar: um nódulo na paratireóide que me pegou de surpresa e que, gente, que coisa, parafraseando caboclinha novamente: “há de ser uma bolinha, é só tirar.”


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